Como se tu fosses eu
Em 23 janeiro 2008 choveram pedacinhos de Green Tea | E-mail this post
Desfez-se em fiapos. Nem lhe vi bem o rosto, mas reconheci-a assim que me tocou no ombro. Levei a mão ao bolso e senti o seu sorriso traquinas de regresso. Sorriso que não cheguei a ver, mas ouvi. Assim que a tentei tirar do bolso, desfez-se em fiapos de nuvens e pó. Agora passa a estar escondida nas ombreiras e nas palavras. Esconde-se na madeira das portas e nas frinchas, abre as asas quando passo e fala-me ao ouvido tão baixinho que só a ouço dentro de mim: só te espero quando não me procurares. És um aperto fundo cá dentro, um nó górdio que ainda não aprendi. E só me apareces em dias de acordes menores perfeitos. Dias frios e plenos de brilho. Quase tristes, quase perfeitos, quase indizíveis.
Ela riu-se e disse baixinho, tão murmurante como etérea, não és tu, sou eu. Fechei o corpo e fugi. Sou muitas numa só, só quando compreenderes que o sumo da romã é mais forte que o vermelho do meu ventre, me poderás ter.
E neste momento, abri as asas. Fechei-te a porta de vidro, escondi-me dentro de mim enquanto caibo na garganta que se prende e se alucina. Desamo-te e desato-me. Fecho-te a porta sem nunca a ter aberto. Sento-me e espero a luz da noite, aquela onde os teus olhos cansados brilham sem que to possa dizer. Não quero esperar, não quero o percurso todo, queria-te já, para darmos as mãos no arco-íris e voarmos em cada átomo de espaço. Não te espero mais. Digo-me fêmea, mulher feita, menina feita mulher. Fecho-te a porta, entrego-te o nó. Fabrica tu peças interiores de corpos. Tudo bem, eu vejo alguém acordado, alguém a sonhar. E vejo-te a duvidar.
[A ouvir ->] Jorge Palma, Disse Fêmea
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